Portugal, A Flor e a Foice de J. Rentes de Carvalho (Quetzal)
“Dizem que
temos valor (os portugueses), mas nos falta dinheiro e união; e todos nos prognosticam
os fados que naturalmente se seguem destas infelizes premissas. ” António Vieira
Uma
obra que esperou quarenta anos para ser publicada em Portugal. Um livro que se
devora autenticamente.
Já o
tenho referido muitas vezes em conversa com amigos: o “normal”, hoje em dia
tornou-se extraordinário. É verdade. Cada vez que alguém vê as coisas de modo
aparentemente normal, as retrata de forma normal e olha de forma normal para a
vida, isso parece absolutamente extraordinário, habituados que estamos a que
todos sejam tão absurdamente inteligentes, tão desmesuradamente acima do que
por vezes conseguimos entender, tão afirmativamente criativos e inovadores,
que, quando alguém nos mostra, o que é significativamente mais difícil, uma
realidade tal qual ela é, ficamos inexplicavelmente espantados. Numa sociedade
repleta de comentadores, analistas, especialistas e outras entidades que
continuamente interpretam e reinterpretam a nossa caminhada colectiva enquanto nação, continuamos a fazer uma ideia romantizada e pobre da realidade histórica
do País. Seja ela a que nos contam por diversas fontes, a Fundação de Portugal
ou o Processo Revolucionário Em Curso. Esta obra de José Rentes de Carvalho,
que diga-se desde já, confirma em absoluto tudo aquilo que ao longo da leitura
da sua obra por aqui vou dizendo, é no mínimo indispensável para se ter uma
noção mais concreta do atavismo português. Descontando o facto do conhecido
temor nacional a quem possa ter opiniões fortes e consolidadas, mas com a
desculpa que dão quarenta anos de distância do acontecido, é para mim difícil ter
opinião sobre todos os que recusaram a publicação desta obra que afirma José
Rentes de Carvalho, uma vez mais como detentor de um assustador poder de escrutínio
sobre o que nos rodeia. De facto, o tom (e alguns factos), são tragicamente proféticos
e tem tanta ou mais relevância para compreendermos este presente resgatado em
que nos debatemos. Ao olhar que se adivinha apaixonado mas sempre
descomprometido que Rentes de Carvalho nos oferece sobre tudo o que antecede e
provoca a Revolução dos Cravos, ao que nela se contém de engano e hipocrisia,
não podemos nem devemos ficar imunes. Escrito de forma superior, com um ritmo e
um encadear de factos interessantíssimos, com um olhar sempre no todo sem no
entanto descurar pormenores (na sua maior parte de um humor impagável), podemos
afirmar sem a mais pequena hesitação que este livro é de leitura obrigatória.
Assim como se pode temer abrir uma garrafa de um vinho antigo, guardada durante
quatro décadas, com o receio de que tenha azedado com o tempo, também se pode e
deve manifestar o espanto pela frescura, actualidade e pleno sabor que todo este
magnífico livro nos oferece. E, no meu caso particular, que o digo muitas
vezes, ficamos com a certeza em forma de letra, de que não basta ter razão. É
preciso saber merecê-la. Muito obrigado José Rentes de Carvalho por mais uma
lição sobre nós mesmos, que tanto andamos precisados.
Boa
Semana e Boas Leituras !!!
Na
Mesinha De Cabeceira:
A
ILHA DO TESOURO de Robert Louis Stevenson (Clube do Autor)
ILHAS
NA CORRENTE de Hemingway (Ed. Livros do Brasil)
A
CASA NEGRA de Peter May (Marcador)
MIRAGEM
DE AMOR COM BANDA DE MUSICA de Hernán Rivera Letelier (Quetzal)
ARCO-IRIS
DA GRAVIDADE de Thomas Pynchon (Bertrand)
A
CONSCIÊNCIA E O ROMANCE de David Lodge (ASA)
C de
Tom McCarthy (Editorial Presença)
O
JOGO DO MUNDO de Julio Cortázar (Cavalo de Ferro)
DIÁRIO
PARA ELIZA de Lawrence Sterne (Antígona)
A
RAPOSA AZUL de Sjon (Cavalo de Ferro)
À
MESA COM KAFKA de Mark Crick (Casa das Letras)
LISBOA
(A cidade vista de fora 1933-1974) de Neil Lochery (Editorial Presença)
FUGAS
de Alice Munro (Relógio D´Àgua)
DANUBIO
de Claudio Magris (Quetzal)
OS
ANEIS DE SATURNO de W.G.Sebald (Quetzal)
ADMIRAVEL
MUNDO NOVO de Aldous Huxley (Antigona)
OS
VELHOS DIABOS de Kingley Amis (Quetzal)
TELEFÉRICO
DA PENHA (IMAGINÁRIO E REALIDADE) de Esser Jorge Silva (Edições Húmus)
LIBRA
de Don DeLillo (Sextante Editora)
CRÓNICAS
DO AUTOCARRO de Manuel Jorge Marmelo (Ed. Autor by Oporto Lobers)
RELATÓRIO
DO INTERIOR de Paul Auster (ASA)
AMSTERDÃO
de Ian McEwan (Gradiva)
ALFABETOS
de Claudio Magris (Quetzal)
PARA
ONDE VÃO OS GUARDA-CHUVAS de Afonso Cruz (Alfaguara)
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