Porno Popeia de Reinaldo Moraes (Quetzal)
"Perversidade é um mito inventado por
gente boa para explicar o que os outros tem de curiosamente atractivo” Oscar
Wilde
Começo por um aviso, que aliás devia constar na capa
deste livro. É para adultos! E de entre os adultos, refaço o aviso: não é para
todos! É das coisas mais difícil de classificar de todas as que tenho lido, e
não me refiro aos últimos tempos. De sempre! É um livro absolutamente genial.
Brutal, crú, inteligente, escatológico, gráfico, descritivo, obsceno, mas
sobretudo de um humor fora de série, e profundamente humano, é bom frisar. O
titulo não é definitivamente uma manobra de marketing livreiro, é de facto uma
espécie de porno (e)popeia. É talvez o retrato mais vivido de alguém que vive
no extremo, o protagonista, o genial José Carlos (Zeca) conta-nos na primeira
pessoa os dias e noites da sua vida absolutamente dissoluta. Não encontro nada
de semelhante na literatura lusa de que me lembre, é como se houvesse um Irvine
Welsh brasileiro, mas num registo tropical, sem todas aquelas sombras anglo-saxónicas
do “Trainspotting” e subsequentes obras de Welsh. É o retrato do bom malandro,
viciado em drogas, álcool e sexo. E simultaneamente acrescenta-nos algo. Todo o
percurso do protagonista é de leitura compulsiva e, oferece-nos em permanência
uma surpreendente visão das coisas. Devo alertar para que o tom e o conteúdo
não são propriamente para os mais sensíveis. Mas que dizer, fiquei “agarrado”
desde a primeira página. Tem momentos absolutamente delirantes de humor, uma
forma de escrever fantástica, recorrendo a um registo quase de oralidade,
aproveitando todas as sonoridades e potencialidades que o calão e a gíria em
que o português do Brasil é tão rico. Suponho que será o tipo de livro que
gerará alguma polémica quanto ao tom, terá reacções de amor/ódio com certeza.
Eu, pela minha parte, mergulhei por completo nesta leitura que tem uma história
e um percurso que, para dizer o mínimo, é atípico. Mas volto a reafirmar que é
uma obra que li e recomendo. E corro esse risco com o maior prazer. Porque para
além do óbvio, do crú, e do que por vezes parece propositadamente produzido
para chocar, contém afinal, aquilo que só os grandes livros possuem. A vida, no
seu esplendor e nas suas pequenas e grandes degradações. Não preciso de grandes
dotes divinatórios para prever que se vai tornar numa obra de referência.
Consensual nunca será, mas é magnífica de qualquer modo. Obrigado ao Miguel
Carvalho que mais uma vez me oferece algumas muito boas horas de leitura. Vá lá.
Atrevam-se e Boas Leituras!
Na Mesinha De Cabeceira:
Kyoto de Yasunary Kawabata (Dom Quixote)
Ferrugem Americana de Philipp Meyer (Bertrand)
Rever Portugal de Jorge de Sena (Guimarães)
O Escrivão Público de Tahar Ben Jelloun (Cavalo de Ferro)
Uma Mentira Mil Vezes Repetida de Manuel Jorge Marmelo
(Quetzal)
Porno Popeia de Reinaldo Moraes (Quetzal)
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